sexta-feira, 9 de setembro de 2011

A busca da pílula da inteligência

Drogas que melhoram a memória e o desempenho cognitivo estão longe de ser aprovadas, mas suas implicações sociais já despertam debates acirrados

O camundongo do filme tinha tido somente três minutos e meio de treinamento, mas havia recebido um coadjuvante farmacológico, e era isso que Tully queria me mostrar. Como um locutor narrando um evento esportivo, ele descrevia a cena quando, de repente, o bichinho parou, dando atenção excessiva ao novo objeto. "Veja, lá vai ele", disse Tully. "Ele está rodeando o objeto... Agora está escalando o topo da maçaneta, sem se importar com o outro objeto." De fato, o camundongo farejava, dava voltas e tornava a subir no objeto novo por todos os lados, ignorando o segundo objeto - explorado no dia anterior.

Atualmente, camundongos inteligentes e ratos treinados são chamarizes para novidades farmacêuticas que podem melhorar a cognição humana.

Para mostrar esse grau de curiosidade, o camundongo tinha de se lembrar do que havia na caixa um dia antes, o que exige a formação de uma memória de longo prazo. Embora anos de experimentos comportamentais tenham estabelecido que os ratos normalmente não se lembram das mudanças no ambiente depois de uma exposição prévia tão curta, aquele se lembrou. Isso porque ele havia recebido uma droga estimulante da memória conhecida como Creb (cyclic response element binding), que a Helicon espera testar em humanos, talvez até o fim do ano. "Mostramos que vários compostos poderão aumentar a capacidade de um camundongo normal se lembrar dessa tarefa", disse Tully. "E para fazer disso realidade, e não uma hipótese, precisamos mostrar que também funciona em humanos."


Atualmente, camundongos inteligentes e ratos treinados estão sendo usados como chamariz para uma nova farmacologia: drogas que podem aumentar a cognição humana, melhorar a memória dos portadores de doenças neurodegenerativas ou idosos, e talvez até reestruturar os circuitos formadores da memória em vítimas de acidentes vasculares cerebrais (derrames) ou pessoas mentalmente retardadas. O mercado potencial para estes produtos é vastíssimo. Como Tully e qualquer outro grande executivo da biotecnologia e farmacologia sabem, há 4 milhões de norte-americanos com o mal de Alzheimer, outros 12 milhões numa condição chamada de incapacidade cognitiva leve, geralmente considerada prenúncio de Alzheimer. Além disso, há aproximadamente 76 milhões de pessoas com mais de 50 anos nos Estados Unidos e muitas delas podem preencher os requisitos do que a Food and Drug Administration (FDA) vem chamando mais recentemente de perda de memória associada à idade, uma forma de esquecimento leve. A julgar pelas vendas de produtos fitoterápicos, como o ginkgo biloba, os consumidores não estão querendo esperar a aprovação da droga. As vendas de gingko biloba ultrapassam 1 bilhão de dólares por ano nos Estados Unidos, mesmo sendo controvertidas as evidências científicas de que o suplemento de fato melhore a memória (ver As Controvérsias do Gingko biloba, SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL, junho 2003). Na Alemanha, as vendas excedem as de todas as drogas inibidoras da cetilcolinesterase usadas para retardar a perda de memória de pacientes com Alzheimer.

Apesar do incessante alarde da mídia sobre a revolução que está por vir, anunciada como "Viagra para o cérebro", as pílulas da inteligência ainda não estão disponíveis. A Cortex, de Irvine, Califórnia, desenvolveu um tipo de droga para melhorar a memória, chamada ampaquina, que a empresa acredita aumentar a energia do neurotransmissor glutamato. Essas drogas foram aprovadas na fase I dos testes de segurança e no momento estão sendo submetidas aos testes da fase II (testes de pequena escala para comprovar sua eficácia) contra o Alzheimer, incapacidade cognitiva leve e esquizofrenia. Estes testes preliminares estão levando a cabo uma odisséia, iniciada na metade dos anos 80, sem nenhuma perspectiva definida em vista.


Postado por: Alessandra Lorenzoni.




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